Como um garotinho que morava em uma caixa deu à Rainha da Suécia uma nova missão

Conhecida por sua simpatia e elegância, a S.M. Rainha Silvia da Suécia, idealizadora e fundadora da World Childhood Foundation, marcou presença em reunião das Nações Unidas realizada na última quinta-feira, 29 de setembro em Nova York.

No evento intitulado Sustainable Development Goals Summit (Cúpula sobre Objetivos de Desenvolvimento Sustentável), a monarca chamou atenção para a integração do tema proteção de crianças às discussões decorrentes no encontro.

Confira abaixo, texto publicado no site da NPR, rede de rádio norte-americana:

A Rainha Silvia da Suécia é bacana, não é?

Em 1976, a famosa banda ABBA parabenizou-a por seu casamento com o rei sueco Carl Gustaf, com uma apresentação de seu sucesso Dancing Queen, na TV sueca.

Na década de 1990, ela começou a defender a causa de proteger vítimas de exploração sexual, crianças abusadas e traficadas, um assunto muito delicado para qualquer um, muito mais para uma rainha conversar em público. Decorrente disso ela fundou a World Childhood Foundation, que hoje apoia mais de 100 projetos em 16 países, com foco na prevenção de abuso infantil, atendimento a crianças vitimizadas ou em situação de risco e também com foco na conscientização e educação da sociedade sobre esses tópicos.

Foi nesse papel, que a S. M. Rainha Silvia da Suécia apareceu em uma reunião das Nações Unidas, na última quinta-feira, com o objetivo de promover a proteção de crianças como parte dos temas na Sustainable Development Goals Summit (Cúpula sobre Objetivos de Desenvolvimento Sustentável). E nesse evento, a monarca de 71 anos de idade, elegantemente vestida e com a voz suave, calmamente desafiou de improviso o participante Hans Vestberg, presidente da Ericsson, grande empresa de comunicação global, para “assumir a causa” de ajudar crianças vitimadas ou em risco. Mas como? Adicionando um aplicativo gratuito para os 7,2 bilhões de celulares da empresa, que educaria e alertaria a todos os usuários sobre os direitos das crianças.

Ainda hoje não temos uma posição de Hans Vestberg sobre esse desafio, mas a Rainha Silvia é uma das poucas autoridades que foi capaz de sugerir direta e cordialmente essa ajuda ao poder corporativo.

Naquele mesmo dia, mais tarde, usando um discreto vestido vermelho rubi e um conjunto de pingente e brincos de esmeraldas, ela conversou conosco por alguns minutos enquanto se preparava para o evento de Gala para arrecadar recursos financeiros. Lá ela agradeceu a várias celebridades por suas contribuições para a organização, incluindo a da atriz Uma Thurman e a da Rainha da Jordânia, Rania Al-Abdullah. Segue uma versão editada de nossa entrevista com a Rainha Silvia.

Como Vossa Majestade se tornou interessada na proteção à infância?

Meu marido e eu viajamos muito, e em várias partes do mundo temos visto crianças em situações precárias. Em uma viagem ao Brasil, onde eu cresci, quisemos visitar uma favela. Quando chegamos lá encontramos um garotinho, que tinha 9 ou 10 anos, que me chamou para me mostrar algo, então eu o segui. Era uma caixa. E ali era onde ele vivia sozinho! “Esta é a minha casa!”, disse ele com muito orgulho.

No retorno à Suécia o nosso voo passou por tempestades terríveis e de repente perguntei a mim mesma: O que teria acontecido com aquele garotinho em sua caixa? Ele estava sozinho, desprotegido e veio em minha mente: realmente tenho que fazer alguma coisa.

O que a senhora fez depois?

Comecei a falar publicamente sobre as crianças de rua e o abuso sexual das mesmas. Devemos ressaltar que isso aconteceu na década de 1990, quando ninguém tinha coragem de falar sobre isso abertamente. Mas se você não fala sobre um problema, não poderá solucioná-lo.

Qual foi a reação inicial quando a senhora abordou o assunto?

Eu me lembro de falar do abuso de crianças em uma conferência em Paris e todos ficaram muito chocados. Eu disse à plateia: “Estou chocada tanto quanto vocês que isto esteja acontecendo, e não é fácil falar sobre este assunto—nem como mulher, nem como mãe ou nem mesmo como uma rainha—mas tenho que conscientizá-los sobre isso”.

E sendo a rainha da Suécia, a senhora também tem um certo poder de levar o assunto para ser discutido.

Prefiro não usar a palavra poder. Mas sim, é claro que posso chamar a atenção para estas questões difíceis. Minha posição de rainha pode ajudar muito esta causa.

Uma das tragédias de qualquer crise de refugiados é que onde há crianças desprotegidas, também estão em cena traficantes e predadores. O que a sua organização está fazendo para proteger as crianças desses indivíduos?

A situação é perigosa. Em setembro eu estava na Alemanha para participar de um seminário sobre a proteção de crianças refugiadas da violência sexual, entre outras questões. Atualmente na Alemanha a Childhood tem 10 projetos em andamento bem como parcerias com 12 empresas para dar educação e também emprego, para que crianças refugiadas realmente possam ter um futuro. [Os projetos fornecem uma gama de serviços, incluindo aconselhamento psicológico, treinamento vocacional e ajuda para melhorar as condições de vida.]

Conte-nos sobre o projeto que a Childhood está executando no Brasil, trabalhando juntamente com empresas de transporte e caminhoneiros para cuidar de crianças desprotegidas.

Em 2002, a Childhood Brasil começou a educar caminhoneiros e empresas de transporte sobre a exploração sexual de crianças e adolescentes. Estamos transformando esses trabalhadores do transporte em nossos embaixadores, para proteger crianças em situação de vulnerabilidade nas estradas [por exemplo, em paradas de caminhões], ou questionar menores sozinhos quando eles pedirem por uma carona.

Então a senhora diria que se estas questões não são um tabu para a rainha da Suécia, não deveria ser um para nós também?

Absolutamente. Nós devemos iniciar esse diálogo e compartilhar a responsabilidade de proteger as nossas crianças.

Essa publicação é uma tradução do texto A Little Boy Who Lived In A Box Gave Sweden’s Queen A New Mission. Para conferir a matéria original na íntegra, clique aqui.

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